segunda-feira, 30 de dezembro de 2013

ABRIGO

Se a noite encontrasse teus olhos

Molhados da tua dor,
Se a brisa da noite secasse  tuas lágrimas
Mas não findasse teu pranto,
E a casa te parecesse tão morta,
E a rua, pela janela entrevista,
Te parecesse pejada dos sons mais tristonhos...
De acordes de piano talvez...
Ou de sons de violino que cortassem teu peito
Bem fundo... como te ferindo de morte...

Eu iria à tua casa e, se deixasses,
Te protegeria no calor do meu abraço,
E te olharia fundamente, e tu verias
Na transparência dos meus olhos minh'alma
Totalmente entregue a ti.
E então tu sentirias o clamor de minha carne,
E nossos corpos se veriam numa amálgama sublime.
A aí a madrugada, miraculosamente,
Pareceria sob o canto das aves matutinas,
E a vida nos seria tão clara, tão leve e tão música,
Qual praça repleta
De gente e de bares, jardins e de sol,
Que quereríamos ambos existir para sempre.

2011

A DANÇARINA

Se a poesia brotasse

De repente
Em plena Rio Branco,
Na forma de uma bailarina
Que dançasse lascivamente enquanto
Se despisse por inteiro,
Dando ao vento os sete véus,

Seria preciso
Desviar o trânsito e recolher
Ao xadrez os transeuntes,
Por serem torpes e perversos
E por isto
Atentarem ao pudor.

Seria preciso chamar os libertinos,
Os palhaços, os circenses,
Os irreverentes
E os cantores loucos
Pr'eles isolarem num cordão humano
A encantada moça,
Que assim poderia,
Pura, sublime,
Saltitar em paz.

2011

INDIGNAÇÃO

Quero almoçar com os porcos,

Quero jantar com os cachorros,
Quero lanchar com os pombos,
Quero cear com os gatos,
Quero falar com os papagaios,
Quero dormir com os morcegos.
Mas não há irreverência
Que me aplaque a indignação.

2011

A EXTINÇÃO DA HIPOCRISIA

Fica extinta neste momento a hipocrisia,

E os casamentos quase todos se dissolverão,
E os futuros casórios de interesses não se consumarão,
E muitas pessoas se deixarão de apertar as mãos.
As reverências dos subordinados desparecerão,
Os bajuladores não mais conseguirão bajular,
Os políticos não mais conseguirão se eleger.
É extinta a hipocrisia, e o que antes era sorriso,
Agora se torna muxoxo,
Agora se torna insolência,
Escárnio, ultraje, desprezo,
E as pessoas, então, despidas de suas máscaras,
Ficarão horripilantes de se olhar.

2011

NÃO ME QUEIRAS DEIXAR

Não, morena, não me queiras deixar.

Eu bem sei que o mundo é imenso
E a canção que vem do mundo é tão sonora
E te convida, te confunde e te inebria,
Mas a minha canção tem mais saudade,
Tem mais querer e mais apego
E se dá como fosses o bem mais precioso,
O achado mais raro e magnífico,
O mais belo panorama que me desse a natureza.

2010

ENTREGA EM VERSEJAR

Eu faço versos com empenho e o fervor das paixões.

Eu faço versos como quem dá as cordas vocais e a alma a uma melodia,
Como se cantasse para uma multidão num lotado anfiteatro.

2010

ESSA QUE ÉS

Se fosses a mulher que eu sonhara,

te chamarias Sofia,
serias bonita e morena,
terias os olhos fugazes
velando inconfessos desejos.

Se fosses as mulher que eu temia,
te chamarias Anita,
serias dissoluta, expansiva
e abririas a casa em festa
com bêbados a cair pelo quintal.

Se fosses mulher de batalhas,
te chamarias Marina,
serias resoluta, aguerrida,
terias firmeza nos gestos,
terias coragem nos olhos.

Mas és aquela que amo
e tens tudo aquilo que quero,
que quero com o zelo infinito
e o apego febril de quem acarinha
tesouros colossais conquistados.

2010

MOV02836 PSEUDOCRITÉRIOS DE AVALIAÇÃO DE ARTISTAS

PERMANEÇA

Fique sempre em minha vida,
Se é tão belo o nosso mundo,
Se é de lira a nossa casa,
Se, ao abrirmos as janelas,
Vem no vento a poesia.

Viva sempre em minha vida,
Se a penumbra prateada
Vem ornar o nosso quarto,
Tem o próprio tom da paz.

Seja eterna em minha vida,
Se é bonita a nossa rua
E se ouvimos vir de longe
O chorar de um violão.

Permaneça em minha vida,
Se na cama dos ardores,
Se nas mãos como de seda,
Nas palavras delicadas
O amor vem, fica a cantar.

2010

ABRIGA-ME

Abriga-me na tua casa, no teu peito
E nos devaneios mais insanos e românticos.
Abriga-me no teu sossego, no teu leito, no teu corpo,
Na magia descomunal que há no teu ser.

Abriga-me no pensamento em cada ausência minha.
Deixa na memória cada orgasmo, cada afago,
Cada frase de doçura e cada olhar enternecido,
E te alegra como em dança cada vez em que eu chegar.

Abriga-me em ti para todo, todo o sempre
E eterniza tua presença nos meus dias,
Te fazendo então a mais bonita melodia
Que o meu ser embevecido possa ouvir.

2010
Revisto e modificado em 2017

A AMANTE DAS ARTES

Um poeta pousou na minha minha vida

E saiu batendo asas logo após.
Ficou tudo cru, tão rude no meu mundo...

Um flautista tocou lindo em meus momentos,
Mas durante um tempo inda menor.
Fez de mim não mais que só silêncio.

Um sambista fez folia nos meus dias
E sumiu com seu pandeiro de repente.
Fez de minha alegria meras cinzas.

Um palhaço trouxe graça à minha vida
E num mês partiu pra sempre com seu circo,
E eu chorei convulsamente por bons dias.

Um ator representou sol renascido,
Mas dois meses foi o tempo que ficou.
Nem consegui dissimular a dor tamanha.

Um pintor me veio e coloriu-me a existência,
Mas partiu com suas telas em seis meses.
Fez minh'alma tão cinzenta e tão sem cores...

Vem chegando um paisagista à minha estrada
E vai fazê-la bela, ornada e floreada,
Tenho esperanças que pra todo, todo o sempre.

2010

SE VOCÊ VIESSE

Se você viesse e se entregasse,

Eu a guardaria no abrigo do aconchego

Do mais fundo do meu peito apaixonado.

Eu a deixaria nos recantos mais melódicos

Dos meus quentes, meus imensos sentimentos.

Eu veria alvorecer em cada instante

De ternura, de promessa e de carinho

E de verbo macio e de doçura.

Eu veria uma fonte que nunca se esgotasse

De razões pra viver pra todo o sempre

No seu rosto aveludado de mulher,

Nos seus braços tão repletos  de carinho,

Nos prazeres inefáveis sobre a cama,

Nas manhãs em que, felizes, acordássemos,

Assim quase como se cantássemos,

Tamanha a felicidade de nós dois.



2010
Revisto e modificado em 2017

COXAS NEGRAS

A mulher negra e bela se senta à minha frente,

Cruza ante meus olhos as roliças negras pernas,
Negras como os rios que cantam mansamente
Nas noites sem lua e sem estrelas.
A mulher bonita cruza as negras coxas,
Negras como as onças negras e noturnas
Que caçam pelas selvas do país.
Negras como as cobiçadas cavidades
Do seu desejado corpo negro.
Negras como os belos olhos negros
Impregnados de viveza e de malícia.
Negras como estes meus versos negros
Envolvidos num negror tão claro e luminoso
De desejo, devaneio e de querer.
2010

FAVELA II

Não é um vilarejo inocente,

Mas sugere algum romantismo.
É um lugar bem modesto,
De uma pobreza flagrante,
De uma beleza singela.

Mas naquela beleza simples,
Não há nos dias da gente
A mais vaga e menor poesia.

As crianças brincam, inocentes,
Mas não sonham qual sonham crianças.
Adolescentes não mostram quimeras,
Mas eterna vigília nos olhos.
Não têm esperança os adultos,
Mas rezam o quanto conseguem,
Pedindo que não cheguem tragédias

Soldados sem farda e camisa
Empunham armas possantes,
Seguindo ordens expressas
De oficiais sem divisas.

O sol reflete nas casas,
Mas não há olhar que se encante.
Alguns jardins bem se avistam,
Mas as flores parecem sem vida.
Nos bares, homens conversam,
E as ruas, repletas de gente,
Não são de viva poesia.
Soa bem alto um batuque,
Mas não há no batuque alegria.

2010

BRASILIDADE PELA METADE

Não me move nem comove todo esse interesse, esse afã desmesurado pela Copa do Mundo, toda essa torcida pejada de paixão pela seleção brasileira, quando em momentos como o tempo das privatizações e entrega do patrimônio nacional (por exemplo a Vale), os fervorosos torcedores ficaram alheios e indiferentes às reais derrotas que o Brasil verdadeira e definitivamente ali sofreu.  Que brasilidade é essa?

2012

MOV01991 NAS PRÓXIMAS ELEIÇÕES, TROQUE SEU CANDIDATO POR UM ANIMAL DE RUA

TRISTEZA

Tenho ido pela vida sem saber pra onde ando,

Como autômato, como apenas empurrado pelo vento,
Entre o medo, a dor e o meu profundo desalento,
E versejo, sem saber porque versejo exatamente.
Consolar-me-ia ver assim escrita e registrada
A tristeza que me apaga, que me assombra e que me mata?
Não, mas os versos me vêm também quase à toa,
Como também trazidos pelo vento.

2010

NÃO TENTE

Não tente vir me provocar

Como se fosse a alvorada com seus pássaros,
Pois só creio na madrugada em seu silêncio,
Que jamais me tenta iludir.

2010

GRANDES PERIGOS

Há um grande perigo em atravessar as vias

Pelas ruas
E andar pelas ruas da cidade,
Porque um acidente ou atentado pode tirar a vida do teu corpo.

Mas há também um grande perigo em atravessar os momentos
Pelos dias
E andar pelos dias desta vida,
Porque um drama ou maldade pode tirar a vida da tua alma.

2010

NASCER DE UM POEMA

Algo faz que me assalte uma emoção

E tome conta ponta a ponta de minh'alma.
E me entrego, quer eu queria, quer não queira,
Seja o que sinta afeto de calor intenso,
Paixão incandescente e sem freio e sem limite,
Ódio de esquentar as faces e fazer os olhos rubros,
Tristeza funda de fazer sombrio o mundo
Ou alegria ensolarada como dança em carnaval.
Não importa o sentimento, pois me toma a emoção
Com seus ventos, seus arroubos e seus frêmitos,
E assim nasce um poema pulsante como as veias,
Como sangue brotado da ferida acesa,
Ou sêmen nascido de um prazer que não tem nome.

2010

A NOITE E NOSSOS OLHOS

Noite de carinho, de projetos e promessas.

Vejo a poesia brilhando nos teus olhos
Tão repletos de paz e de luar.
Ouço músicas antigas e tão belas
E tão cheias de passado e de saudade,
Mas tua presença faz alegre a nostalgia.

Cantas uma canção singela, pequenina,
Mas que me toca e até faz prantear.

Meus olhos são teus, teus com tamanha demasia,
Que se fazem cheios de palavras
No ato puro e simples de te olhar.

Noite, músicas, teu beijo e a paz desses teus olhos.
Vivo então a mais bonita, mais profunda poesia.

2010

AQUELA MULHER MAGRICELA

Aquela mulher magricela,

Que não é nem feia nem bela,
Traz uma história consigo
De arrepiar, meu amigo!

Mulher de muitos amantes,
De ardor singular, flamejante,
Segundo comentam parceiros
Que foram-lhe só passageiros.

Um dia um homem sereno,
Casado, de filhos pequenos,
Por capricho, mera aventura,
Envolveu-se co'a tal criatura.

Problema maior disso tudo:
Um dia se viu ele mudo,
Cego, surdo de amor por ela,
Que, vê, não é feia nem bela.

Deixou esposa e crianças,
Matou toda viva esperança,
À casa deu cor de saudade,
Pintou de infelicidade.

A pobre a esconder pelos cantos,
A doida convulsão do pranto,
Crianças quedadas de espanto,
Tristonhas, sem ter acalanto.

Pra que você bem me entenda,
Ficou a família sem renda.
Não queira meu Deus que eu minta:
Tornou-se família faminta.

Uns poucos anos passaram,
E as coisas então se mostraram:
Vivia o rapaz aos lamentos:
Não lhe tinha a mulher sentimentos.

Foi ele mais ainda ferido:
Um dia descobriu-se traído.
Deixou-a, atingido nos brios,
A alma em dor, calafrios.

Procurou a cônjuge antiga:
Queria uma amante, uma amiga.
Mas não tinha-lhe a ex mais afeto:
Agora o achava abjeto.

A moça até se casara,
A outro se afeiçoara.
E os filhos ao homem chegado
Já tinham até se apegado.

Vê quanta tristeza causada
Por capricho da desalmada,
Aquela mulher magricela,
Que não é nem feia nem bela?

2010

O IMPÉRIO DO MAL

Se, antes do processo da chamada globalização, o mercado de trabalho já induzia as pessoas a competições ferozes, após o advento do mencionado sistema,  as coisas pioraram muito gravemente.  Se outrora a força de trabalho de uma empresa girava em torno do empresário, com os colegas  se digladiando por galgar postos mais altos, hoje o cenário se tornou bem mais perverso, simplesmente bestial, porque a minimização(ou quase extinção) de barreiras comerciais   fez que as indústrias aumentassem a produção para o atendimento de uma demanda internacional, e, como concorrência exige menor preço e maior qualidade possíveis, os empresários adotaram a política de mão-de-obra barata e o mais qualificada possível.  E, em consequência disto, há nestes dias uma contratação em massa de trabalhadores estrangeiros, como os coreanos, que trabalham por valores módicos, e, ainda dentro da mentalidade de trabalho bom e barato, os capitalistas, não satisfeitos em atuarem pela supressão de inúmeros direitos trabalhistas,  resolveram ainda fazer os seus funcionários tirar leite das pedras, sacrificarem-se à exaustão, produzirem além da própria capacidade, abrindo os patrões verdadeiras competições dentro de suas verdadeiras arenas comerciais, onde, na área de vendas por exemplo,  os vendedores são agrupados em facções que disputam entre si os melhores resultados de vendas a cada mês, e o desfecho disto é em geral o reconhecimento pelo patrão do bom desempenho dos vencedores e algumas retaliações aos perdedores, podendo atá haver perda do emprego.  
Neste contexto, travam-se verdadeiras batalhas dentro das firmas, com todos almejando sobreviver ou projetar-se a qualquer custo,  tentando permanecer o mais longe que possam da degola.  O preço disto é uma deterioração ética e moral  e uma  desumanização sem precedentes das pessoas, porque são estas em seus postos de trabalho permanentes lutadoras por não serem atiradas de um abismo, e uma luta de vida ou morte requer todos os esforços possíveis e aceitáveis ou não pela autopreservação.
O grande beneficiário dentro de todo este cenário bizarro e horripilante é, sem dúvida nenhuma e como sempre, o empresariado, o capital, os grandes capitalistas, os mesmos que com sua ganância levam os países às guerras e geram incalculáveis concentrações de miséria por conta da má distribuição de renda.  Fazem estes agora que mais zelosamente o planeta gire em torno de suas monstruosas pessoas.  Sem contar que alimentam a má natureza do homem e infundem entre os humanos princípios demoníacos de ausência de solidariedade, de falta de compaixão,  colocando a vitória acima da probidade, extirpando das criaturas qualquer traço de bondade.
Há entre os místicos aqueles que consideram que o Céu e o Inferno estão aqui mesmo, e eu penso que eles estão cobertos de razão, mas vejo-me um tanto quanto pessimista, porque, ao que parece, a ambição doentia dos poderosos há muito transformou o mundo unicamente em império do mal.

2011

A MOÇA E O MAR

Luzes de artifício brilhando,

Luar refletido no mar.
Deixa dormir a tristeza,
Deixa morrer o passado
E olha nos olhos da moça,
Tão cheios de espera e amanhã.

Deixa dançar sobre as águas
As múltiplas luzes da noite
E olha no rosto da moça
Um canto de pura esperança.

Olha no corpo moreno
A cor e o calor do desejo.
Olha no riso sereno
Um ar de quem se quer dar.

Pisa teus pés no presente,
Joga teus olhos no mar.
Toma essas mãos dessa moça
Para um novo tempo brotar.

2010

TEMPO DE TRISTEZA

Em noite profunda de inverno,

Sem música, estrelas, luar,
Cantei uma viva esperança,
E era tão diurno meu canto...

Em dia profuso de gente,
Com sol, nuvens alvas, céu claro,
Cantei uma dor que me vinha,
E era tão noturno o meu canto.

O canto é o espelho da alma,
A alma é que diz se as horas
São claras, escuras, cinzentas,
Se o dia pra nós anoitece,
Se a noite pra nós amanhece.

Durante um tempo bem longo,
O escuro invadiu meus momentos,
Me fez as manhãs tão noturnas,
Me fez anoitecer pelos dias,
Numa tristeza fundamente doída,
Mas doída de parecerem os minutos
Derradeiros momentos de vida.

2010

VEM VIVER

Vem ver dançar a noite

No batuque alegre,
Nos bares lotados,
Na gente a passar.

Vem ver cantar a vida
Na lua gigante,
No céu estrelado
A rebrilhar no mar.

Vem dar-te uma chance
De sorrir-te o mundo,
De gritar no peito
Um amor imenso.

Vem me dar teus olhos
E o teu peito ávido,
Faze de minh'alma
Um valsar sem fim.

2010

Ouça o poema musicado e cantado por MARCELO BIZAR
https://soundcloud.com/bar-o-da-mata/vem-viver

OS POETAS DA VIDA

Quando amanhece, e as casas se enfeitam do sol,

Nós, sentinelas da manhã, matutinos poetas,
Contemplamos o dia, na avidez de um tempo feliz.

Quando a tarde acende as ruas e gentes,
Nós, sentinelas da tarde, vespertinos poetas,
Lambemos a tarde, sedentos de plena alegria.

Quando artifícios de luzes acendem a noite,
Nós, sentinelas da noite, noturnos poetas,
Sorvemos a noite, famintos de amor.

E a vida assim segue, ora escura, ora clara,
Dançando ritmos vários, às horas ligados,
Nós, sentinelas da vida, poetas sempre em vigília,
Dançamos todos os ritmos, sequiosos então de viver.

2010

A TARDE

Tinha sol, vento fresco, um bocado

De gente passando nas vias.
Tinha a praça, os bancos, arbustos,
A tarde de acesa alegria.

Tinha os carros, os jovens falantes,
As crianças em viva euforia,
O semblante de paz de uma moça
Que levemente sorria.

Tinha o olhar brilhante do jovem
Que em divagações se perdia.
Tinha a luz fulgente do sol,
Que em meu ser reluzia.

Tinha nuvens tão brancas no céu,
O azul o mar parecia.
Eu bem via o relógio da praça,
Mas o tempo não existia.

Era a tade inquieta e bonita,
Que a todo vivente envolvia:
Era vida, era cores, tão clara,
Era um fogo infinito de vida
E ao meu peito por completo acendia.

2010

PARTIDA

Partiu sozinho e tão tristonho,
E uma melodia de pura melancolia
O acompanhava, teimando em ficar na memória.

Partiu, macambúzio, sem alento.
Tinha um longo caminho a percorrer,
Mas ainda maior era o tamanho da sua agonia.

Partiu. Nenhuma ilusão havia.
Não havia horizonte, expectativa,
E a estrada a seguir era árida e sombria.

Partiu. Não tinha mais sonho nem ânsia.
Não tinha esperança, desejo nem vida.
Andava apenas. Nada mais tinha. Apenas seguia.

2010

A TELEVISÃO, "ROQUE SANTEIRO" E DIAS GOMES

Não há sombra de dúvida de que a televisão, principalmente a aberta, não tem  quase nada de bom.  Mesmo as tevês por assinatura deixam muito a desejar, porque as produções cinematográficas dos últimos quinze anos são, em sua grande maioria, absolutamente sofríveis, difíceis de assistir sem dar um muxoxo e mudar de canal.  E mudar em vão, porque, se você não for apaixonado por ciências  e não estiver a fim de saber como foi inventada a máquina fotográfica, ou se ainda não quiser ver um sujeito que finge que está fazendo sobrevivência e dá realismo à sua brincadeira em matar e estripar animais na sua frente ( o desgraçado uma vez abateu uma rena a faca e comeu-lhe o coração ali  na hora, para delírio dos sádicos), você só terá como opção assistir à Animal Planet, mas com um ônus:  ficará desolado e transtornado, porque os caras dão preferência a mostrar animais sendo abatidos por predadores ao invés de mostrar os hábitos dos bichinhos.

Em resumo, a televisão oferece pouquíssimas alternativas, e a Globo, que não é nem um pouquinho diferente das outras emissoras, só apresentando entre suas raríssimas exceções o "Globo Repórter", que nem parece produção da mesma empresa que tem a cara-de-pau de mostrar um programa ridículo, rasteiro,  barato, apelativo, piegas e imbecilizante como o "Big Brother Brasil ".  A Globo tem dessa coisas: de vez em quando produz algo como "O Tempo e o Vento", "Mad Maria", "Os Maias", etc, mas isto acontece uma vez a cada passagem do cometa  Halley pela Terra.
Tanto é verdade que acontece a cada passagem do cometa Halley, que "Roque Santeiro",uma dessas raridades, vem justamente na época de o astro ser visto por aqui.  
Roque Santeiro é uma anedota brilhante do falecido Dias Gomes.  Reprisada hoje no Canal Viva, que é para  onde os globais mandam algumas de suas boas produções (mas longe de mim querer dizer que o Viva é um bom canal, porque também é cheio de esterco televisivo), me faz a cada dia mais certo de que esta novela é a melhor novela brasileira de todos os tempos.  Tudo na telenovela me fascina: primeiramente o enredo, depois a interpretação dos atores e a maneira como estes compuseram os seus personagens, por fim os cenários e a álacre atmosfera que neles existe.   O grande fato é, enfim, que é um enorme prazer ficar grudado diante da tevê a assistir aquela ideia brilhante do genial autor de preciosidades como "O Pagador de Promessas" e "O Bem-Amado" (a novela e a série) entre outras pérolas.  A gente se delicia com o casal cômico-romântico Sinhozinho-Porcina, representado pelos talentosos Lima Duarte e Regina  Duarte; dá-se ao luxo de observar atores como Armando Bógus (também excelente e infelizmente também falecido), Cássia Kiss, Othon Bastos, Yoná Magalhães, Ary Fontoura e outros;  vê a perfeição com que  Paulo Gracindo e Cláudio Cavalcânti , cada um mostrando um setor (um, conservador, outro, progressista) da Igreja Católica.  O morto e então  idoso ator encanta a gente na pele daquele padre severo, mal-humorado, rabugento, mas omisso e de certa forma conivente com as articulações  menos justas e éticas dos vilões de Asa Branca, cidade que se tornaria objeto de uma verdadeira apocalipse se viesse à baila toda a verdade sobre Roque Santeiro (vivido pelo também grande José Wilker).  A economia da cidade dependia do mito, porque este gerava empregos porque induzia à fabricação e comércio de artigos religiosos, à vinda de  procissões e romarias à cidade e assim ao turismo, outra atividade de peso que contribuía para a saúde financeira do lugar.  Toda a engrenagem girava em torno da mentira, que, se uma vez revelada, faria tudo ruir.
"Roque Santeiro", que substituiria em 1975 a novela "Gabriela"(outra preciosidade, embora não do tamanho da de Dias Gomes), foi na época vetada pela censura dos militares, só podendo ir ao ar em 1986.  Deixa na gente um sentimento de perda muito grande, porque a genialidade de Dias Gomes só é desfrutada porque sua obra ficou, mas é duro saber que nada mais o autor poderá criar.  É triste, porque acho que os bons e os talentosos (do bem ) não deveriam morrer nunca.

2011

VIZIM DE ZÉ CARDOSO

Vem cá, vizim, desce uma pinga, que eu te conto:

Ninguém no mundo é mais feliz que Zé Cardoso.
É que, cedim, toda manhã, beija a menina
De cabelim assim curtim, sorriso franco,
Bonita assim que nem os campo bem verdim.

Aquele beijo mais parece que alimenta Zé Cardoso,
Que prá labuta sai feliz de inté sartá.
Entra a menina a sorrir por casa adentro,
E eu fico oiando as coxa grossa, bem clarim,
E sonho vendo o vestidim a balançar.

O dia inteiro aquela potra lava, passa,
Varre, cozinha e canta assim qual passarim.
É tão bonita com zoim assim pretim,
Tão infantis e serenim, cheim de paz.

De tarde chega Zé Cardoso todo prosa,
E ela se agarra, alegre, moça, ao seu pescoço.
Depois, vizim, é um converseriro sem tamanho.
Um tal de "amor", "benzim" pra lá, "benzim" pra cá,
E a casa, assim, meu bom vizim, parece em festa.

Eu imagino, meu amigo, que à noitinha
O meu vizim é mais feliz que um fazendeiro,
Porque a deusinha, se entregando entre sussurros,
É bem capaz de qualquer cristo endoidecer.
E eu te confesso, sou tão só, que sinto inveja
E uma tristeza grande assim de contorcer.

2010

Música de MARCELO BIZAR em meu poema LIRISMO

https://soundcloud.com/bar-o-da-mata/lirismo-1

LIRISMO

Vem, canção bonita, alimentar minh'alma.

Vem, mulher-encanto, nutrir meus desejos.
Vem, lua crescente, pratear meu corpo.
Vem, noite serena, traze-me um poema
Fresco como a brisa, brando como tu.



O ICONOCLASTA

Não exaltarei salafrários engomados e com títulos pomposos

Que detêm nas mãos sujas poder e autoridade imerecida.
Não farei reverências a senhores e doutores,
Sobretudo pela parca moral das pessoas
Para o exercício do mando, poder, senhoria.

Não farei louvações a calhordas de terno
Que decidem destino de gentes e povos sofridos,
Que fazem das vestes capa de suas sarnas malditas,
De sua podridão intrínseca, vindas da mente abjeta.

Não homenageio fraques, fardas, coroas e togas,
Porque conheço profundamente a pequenez dos homens.
Não farei vivas a abastados ridículos
No alto de suas fortunas como de pedestais.

Não farei canto a gente emproada, arrogante
Que se vê qual deidade de carne e de osso.
Não farei verso a enfeitados de ouro e de brilho,
A criaturas cheias de "cumpra-se" e "faça-se".
Não saudarei quepes, brasões e divisas.

Também não cultuarei mitos e grandiosos de plástico.
Ao contrário: desmantelo os mitos, dissolvo os heróis
Com o meu senso de realidade iniludível.
Os mitos arrotam, engasgam, são bem como nós;
Heróis, se algum há, quero ver e tocar.

Eu vejo a cara dos homens tal como é a cara dos homens.
Não me iludo ou fascino, imune a todos embustes.
Ninguém a meus olhos fará belo o que é feio,
Fará grande o que é mero, é reles, é vil.

2010

BELEZA MATUTINA (QUASE UMA CANTIGA DE RODA)

Beleza matutina:

Em cima do telhado
Cantou o bem-te-vi.
Aqui vejo da varanda
Uma serra tão verdinha,
Tão bonita de se olhar.

Se eu visse a ti dançando,
Sonhando pela estrada,
Eu pegava uma viola
E saía a acompanhar.

Manhã clara, tão bonita,
com jardins de muitas flores.
Os teus olhos de esmeralda,
Duas contas de encantar.

Manhã ensolarada,
Os arbustos a bailar.
O teu rosto é porcelana,
O meu peito é o teu lugar.

2010

ALMA EM LUZ

Eu tenho alma,

E um samba tão bonito, vindo lá da rua
Vem chamar minha'alma a ir sambar.

Eu tenho samba,
E um desejo de viver me acende numa lira
Que se enche de louvor à noite alegre.

Eu tenho lira,
E ela queima como a rua, a noite, o samba,
Vicejada das pessoas e das luzes de artifício.

Eu tenho luzes
Que me brilham n'alma viva, tão vibrante,
Que parece que jamais (a alma) se apagará.

2010

ENTENDA POR QUE GOVERNAR OU SER POLÍTICO É EXTREMAMENTE ERÓTICO

É... Tudo  é mesmo uma questão de ponto de vista.   Se nós ficamos aqui a achar que os políticos (ou   uma boa parte deles) são desonestos, aéticos, isso e aquilo... se pensamos que há falcatrua ou vigarice nesses e naqueles atos dos caras, o nosso "querido" deputado Jonas Pereira Jojoba, o tão mencionado (por mim) Jonas, o Salafrário,  numa conversa de gabinete, expôs ao seu colega Sandro Lessa a sua visão sobre a questão:

- Meu caro Sandro, a verdade é  que  o que pessoal chama de pilantragem é, na verdade, muito erotismo.  Ou seja, governar é algo extremamente erótico.
- Erótico?? - espantou-se Sandro.
- É, erótico... - insistiu Jonas.
- Mas como assim?
- É fácil entender.- nosso protagonista começou a elucidar com voz pausada - Qual a analogia que há entre o povo e a mulher solitária?
- A analogia...?
- É, analogia, Lessa. Pois eu respondo: é a carência. A mulher solitária tem carência de afeto, o povo, carência material, financeira, de saúde, educação, habitação, segurança,  essas coisas. Mas o grande fato é que, embora  tipos de carência diferentes, tudo é carência, carência é sempre carência, certo? 
- Certo.
- Então, veja bem: quando você tá a fim de se eleger, o que é  que você promete ao povo?
- Educação, emprego, saúde, melhores salários...
- Pois é.  E agora, quando você tá a fim de "pegar" uma mulher solitária, carente,  o que você promete?
- Amor, paixão, carinho, sexo...
- É isso aí: amor, paixão, carinho, sexo! Sexo, viu!? Começou a ficar erótico.  Agora me responde: como é que você faz prá mulher deixar você "pegar" ela firme?
- Bom, depois das promessas, quando ela tá caidinha por mim e me deixa encostar, chegar pertinho, antes de partir pro "abate", eu passo o nariz na nuquinha dela...
- E aí, como pé que é com o povo? Como tu faz pra ganhar o voto?
- É parecido: eu elogio, dou festa, afago...
- Taí! Você afaga o povo como afaga a mulher! Não é isso?! - e Jonas era agora agitado e veemente: - Afaga, não é isso?!
- É...
- E depois que tu promete e afaga, e ela se desvanece, se derrete todinha, fica doidinha?
- Ah! Aí, meu amigo...- Sandro tinha um riso safado no rosto - Aí, meu amigo...
- Fala, Sandro, fala! Olha que, como a mulher, o povo se desvanece e se derrete todinho!... Fala, Sandro, fala!
- Ah! Aí, meu amigo...
- Fala, Sandro, desembucha!
- Aí... - deu Sandro uma risadinha - Aí eu sodomizo mesmo!
- Pois é, Lessa! - concluiu Jonas - Primeiro a gente promete e faz carícias, depois a gente sodomiza.  Então?  Ser político ou governar é ou não é bastante erótico?

2011

DOS POEMAS QUE FAÇO II

Eu faço versos com o encantamento de menino enamorado,

Com a pulsação fremente dos teimosos aguerridos,
Dos amantes sequiosos em seu leito de luxúria,
Co'a tristeza desolada dos sozinhos desamados,
A alegria radiante dos circenses espetáculos,
O cansaço sem remédio dos da vida desistentes,
Com o ódio incandescente dos febris injuriados...
Mas versejo sempre numa profusão de sentimentos
Aflorados do mais fundo do meu peito apaixonado,

2010

DOS POEMAS QUE FAÇO

Eu faço poemas com a intensidade de quem recita no teatro,

Tentando descrever com clareza singela cada pura emoção.
Porque cada emoção é pura e singela:
Pura e singela qual menino a correr pela várzea,
Como gato ou cachorro a banhar-se do sol.
Por isto quero o meu verso puro e claro,
Assim como peixe nadando em água cristalina...
Mas quero meu verso comovente e tocante,
Comovente como adeus irrevogável entre amantes,
Tocante como acordes de violão em noite de abandono,
Como prece doída de tanta, tão funda emoção.

2010

MANHÃ EM VIDA

Eu vi a manhã assanhada em festa,

Na dança de vida vibrante das pessoas adentrando os automóveis,
Na diversidade das cores das roupas, carros, lugares, pedestres,
Na esperança percebida nos rostos de muitos dos que passavam.
Vi a vida em álacre dança, e minh'alma se comprouve em sorver a alegria daquela manhã...
E se banhou daquela esperança e daquele sol manso,
E acompanhou cada passo da dança,
Embriagou-se da viveza do dia de outono
E se acendeu, embebida das luzes e cores da vida.

2010

DEFESA AOS ANJOS


Eu quero a salvação de cada touro bravo e cada cavalo chucro violentado nos cruéis e sórdidos
[rodeios, onde a maldita morbidez de gente desgraçada promove espetáculos hediondos para
[demônios imundos que se comprazem do sofrimento moral e físico.
Eu quero que este anticanto pejado de ódio e fúria perfure os intestinos dos membros das
[indústrias pesqueiras que assassinam perversamente as baleias e tingem de rubro o azul
[ do mar.
Eu quero que algo haja que puna com dor e agonia os dirigentes canadenses que
[ se dão à empresa nefasta de matar leões-marinhos e focas.

Eu quero cada animal respeitado como ser vivente passível de dor e sofrer,
Como irmão de cada um de nós que é, por filho da Natureza.
Eu quero cada animal amado como irmão indefeso dos homens.

Eu quero a paz para cada bicho inocente, acarinhar os cães, tão afáveis e ternos,
Os gatos, tão fugidios e cautos, os galos, tão aguerridos, valentes.
Eu quero irradiar amor puro e absoluto para as criaturas puras do mundo,
Por serem os únicos anjos que realmente, que verdadeiramente há.

2010

PROMESSA (POR VOCÊ)

Por você

Trilharei caminhos insólitos,
Consultarei os oráculos, magos,
Revirarei os baralhos ciganos,
Cantarei os hinos mais místicos.

Por você
Recorrerei a deuses exóticos,
Me esmerarei em ritos, feitiços,
Desvendarei as vidas passadas,
Vislumbrarei existências futuras.

Por você
Cumprirei os trabalhos de Hércules,
Cultivarei os campos de afeto,
Semearei a paixão mais acesa,
Erguerei plantações de amor pleno...
Por você...

2010

música de MARCELO BIZAR em meu poema MEU SANTO ANTÔNIO

https://soundcloud.com/bar-o-da-mata/meu-santo-ant-nio

MORENA

Vai, morena,

caminha, morena,
rebola, morena,
a bunda morena
à beira do mar.

Bebe, morena,
te deita, morena,
te doura, morena,
ao sol escaldante,
me deixa te olhar.

Abre, morena,
o sorriso menino,
permite, morena,[
eu ser teu devasso
por hoje somente.

Vamos, morena,
viver neste dia
dourado e de luz
um doce poema
de amor e de ais.

2010

A MULHER


Canto as mulheres como fossem deusas, pelo fascínio que me exercem,
Por ver nelas, em cada uma, um tanto de Vênus,
Um quê de ninfa, um tanto de fada e de heroína dos romances,
Por captar-lhes fundamente o poder magnético e a magia.
Eu canto a mulher existente ou que já tive, rebatizada nos meus versos;
Eu canto a mulher inventada a partir das mulheres vistas nas ruas ,
Da mulher cuja beleza me embevece, à qual dou nome e dou história...
Mas canto a mulher...
Com esmero e com veneração!
Canto a mulher porque é como cantar as paisagens majestosas,
Como cantar os anseios mais ardentes, palpitantes,
Como cantar a cidade mais acolhedora, aconchegante.
Amo a mulher. Amo com o fervor mais exaltado,
O desejo mais vibrante, numa coisa que é qual devoção, um dar-se em prece aos
[ elementos transcendentes,
Como minha alma se elevasse alimentada do mais alto, milagroso,
Mais sublime arroubo do desejo e da paixão.


2010

PARA SER FELIZ

Pra que eu veja brilhar a esperança,

É preciso a tua presença
E os teus braços de afeto pra mim.

Pra que o dia amanheça bonito,
É preciso uma noite cálida
E os teus olhos de mar nos meus.

Pra que o canto não seja inaudito,
É preciso que a mim tu te entregues
Num querer, num afã sem limite.

Pra que a vida pareça folia,
É preciso que um só nós sejamos,
Que vibre em meu peito a alegria do teu.

2010

VIDA OCULTA

Pare, ouça, olhe-se e acredite,

note e se dê conta que não ressecou:
saiba que essa sua aparente morte
não é mais que oculto palpitar de vida,
Eu noto a esperança a lhe brotar nos olhos
e no seu semblante uma avidez oculta,
uma inquietude murmurante e cálida
a passar silente pelos seus sentidos
sem que sua alma dela se aperceba.

2010
Revisto e modificado em 2012

FICA LONGE DO MEU CANTO

Fica longe do meu canto:

ele pode te espetar.

Fica longe do meu canto:

ele pode até morder.


Fica longe do meu canto:

ele pode ser uma carapuça alérgica

com a exata medida da tua cabeça.


Fica longe do meu canto:

ele pode ser um capetinha

que tenha prazer em te irritar.


Fica longe do meu canto:

ele tem o sadismo de um moleque

que, ao passares, põe o pé na tua frente.


Fica longe do meu canto:

ele tem o prazer doentio

de te ver em raiva te morderes.


Fica longe do meu canto,

que ele cospe marimbondos

e quer ver-te apoquentado,

igualmente furibundo.


Fica longe do meu canto,

porque és por demais elementar,

e ele sabe como poucos sabem

as feridas que carregas te dedar.


2010

Revisto e modificado em 2017