domingo, 4 de outubro de 2015

BELCHIOR, ESQUECIDO, O PENSADOR DE VERDADE


A área de cultura do Brasil deve muito a  Antônio Carlos Belchior,  este cearense nascido em Sobral,  no ano de 1946.  Autor de sucessos do quilate de "Como Nossos Pais"(interpretado magistralmente por Elis Regina), onde observa que, "apesar de termos feito tudo o que fizemos, ainda somos os mesmos e vivemos como os nossos pais", numa contatação de que toda geração se vê evoluída e sábia em relação às anteriores e no entanto depois constata com certa frustração que é pouco diversa destas, quer no pensamento como no comportamento, não trazendo consigo as profundas mudanças sempre desejadas e não tendo ido além de uma postura rebelde natural e instintiva dos humanos.  Na música ainda alude a que nem sempre os líderes e formadores de opinião são, se comparados aos seus  seguidores,  apegados de forma aguerrida às coisas que professam, tendo até um profundo zelo pela autopreservação: " Hoje eu sei que quem me deu a ideia de uma nova consciência e juventude, tá em casa, guardado por Deus, contando vil metal".  Um niilista o Belchior, com ideias claras e canções altamente melodiosas.
Dentro deste mesmo niilismo cria "Dândi", com trechos como: "Mamãe, quando eu crescer
eu quero ser rebelde, se conseguir licença do meu broto e do patrão. Um Gandhi  dândi, um grande milionário socialista: de carrão chego mais rápido à revolução."  Já não acreditava num socialismo hoje numa profunda crise de credibilidade, doutrina utópica da qual muitos líderes despudorados se aproveitaram para enriquecer e se encher de poder enquanto manipulavam seus adeptos, que morriam e matavam em lutas sangrentas.  É quase que inteiramente a reafirmação do que deduz na música cantada por Elis.  Belchior é um visionário.
Em "Pequeno Perfil de Um Cidadão Comum"  fala das pequenas (ou grandes) ilusões e enganos do pequeno-burguês: "Era feito aquela gente honesta, boa e comovida, que caminha para a morte pensando em viver na vida. Era feito aquela gente honesta, boa e comovida, que tem no fim da tarde a sensação da missão cumprida."
Belchior é um pensador inato, observa a vida e as pessoas com olhos aguçados, é um homem de perspicácia incomum, que hoje se vê perdido, sem rumo e sem norte,  falido, menosprezado, desconhecido das novas gerações,  corrido, fugido, esquecido.
O Brasil é extremamente injusto com quem cria de verdade.  Este  mesmo Brasil que define Valeska Popozuda como "pensadora",  renega o genuíno talento, chuta pra longe quem tem real valor e fica cultuando a breguice ridícula e rasteira do "funk", as celebridades indevidas e descabidas dos "big brothers" e outros "reality shows" da mesma vil e baixa qualidade: são universos desqualificados e carentes do mais ínfimo intelecto, com apelos sexuais que nem por uma fração de segundo os consegue elevar de algum modo.  O Brasil não gosta do que é antigo, despreza a própria cultura, odeia  cultura na acepção de conhecimento, por isto é o paraíso dos espertalhões da política e do poder econômico, que amoldam a cabeça das massas ignaras aos seus interesses, produzindo concentração de renda e consequente pobreza, ignorância, miséria, deixando-lhes como forma de consolação as famigeradas bolsas-família e outras esmolas nascidas da infâmia dos poderosos.
Não nos iludamos: um povo que não sabe escolher seus artistas, muito menos sabe escolher seus representantes e dirigentes.  Uma gente que não tem conhecimento só sabe produzir para si mesma miséria, uma miséria autotrófica, porque produz  para si os elementos de que se nutre, que são a ignorância e o desconhecimento, que mantêm a miséria firme e vigorosa em seus alicerces.
Todo este quadro aprofunda e agrava o processo de declínio e empobrecimento cultural pelo qual o país passa, fazendo deste uma nação sem memória, sem  cultura própria, sem tradições e sem conhecimentos, sem referência nem noção de valor artístico,  atada com garras profundamente encravadas à sua ignorância.

Barão da Mata

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